terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Acontece ...

Especialização em jornalismo científico na Unicamp

7/12/2010

Agência FAPESP – O Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo (Labjor) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) abrirá em 3 de janeiro de 2011 as inscrições para o curso de pós-graduação lato sensu em jornalismo científico.

As inscrições deverão ser feitas até 31 de janeiro de 2011 por meio de um formulário eletrônico que estará disponível no site da instituição. O processo seletivo será composto por duas fases. Na primeira, os candidatos deverão enviar por meio eletrônico a ficha de inscrição preenchida, além de um curriculum vitae e um texto de sua autoria sobre o papel da ciência e da tecnologia no desenvolvimento nacional.

Os candidatos aprovados na primeira fase da seleção serão convocados para prestar provas escritas e de proficiência em inglês e para uma entrevista com um dos professores do curso. Os resultados serão divulgados no dia 4 de março de 2011 e o curso será iniciado em 14 de março.
Em sua sétima edição, o curso gratuito se destina à formação de jornalistas científicos, divulgadores da ciência e assessores de comunicação de universidades e institutos de pesquisas, e tem o objetivo de formar profissionais que tenham visão global sobre o sistema de ciência e tecnologia e da relação com os meios de comunicação de massa.

Mais informações: www.labjor.unicamp.br

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

13 motivos para o domingo!

Ainda sou estudante de doutorado, mas minha idéia um dia é trabalhar em uma universidade pública, de qualidade, divulgando ciência e participando da formação dos futuros profissionais do país. Isso tem relação direta com a política social e educacional adotada nos últimos anos. 13 motivos que influenciaram minha escolha estão listados abaixo:

1 - Somos 183,9 milhões de brasileiros (IBGE 2007) e um governo só é efetivamente do BRASIL quando governa para, pelo menos, 90% da população. Foi isso que o 13 fez nos últimos anos.
2 - O Presidente é uma figura representativa no país. Um conjunto de assessores, com idéias diferentes, ajuda em todo o processo governamental. O atual ministro da educação, Fernando Haddad é, a meu ver, o melhor de todos eles.
3 - A educação no país, com exceção de São Paulo e Minas Gerais (que eu pude acompanhar), passa pelo seu melhor momento na última década.
4 - Antes de eu iniciar minha pós-graduação o maior temor era que meu nome apenas ampliasse a lista de doutores estagnados no país. Nesses últimos anos, praticamente todos os doutores foram aprovados em concursos públicos para universidades federais.
5 - Ainda no quesito educacional, houve uma expansão (ainda em andamento) das universidades federais. Isso não pode parar com a troca de governo.
6 - O número de jovens com acesso à educação pública é infinitas vezes maior nos últimos anos.
7 - Problemas educacionais são resolvidos com discussão e aporte de conhecimento. Não com bombas de gás.
8 - O desenvolvimento científico-tecnológico do país nos últimos anos é inquestionável.
9 - Fora o incentivo à capacitação e formação de nos professores e pesquisadores.
10 - As políticas sociais implementados pelo 13 nos últimos anos atingiram uma parcela enorme da população e foram dignas de reconhecimento internacional. Uma magnitude invejável!
11 - Permitiram que grande parte da população melhorasse em muito sua qualidade de vida. É lógico que há problemas e não é fácil administrar um programa em um país do porte do Brasil. Mas eu tive a oportunidade de acompanhar a situação da população no norte do país e a realidade é muito promissora.
12 - Estive na Amazônia durante dois meses e o que vi é uma população em processo de alfabetização, com luz há apenas quatro anos, podendo complementar o cardápio, baseado em mandioca e caça, com arroz e feijão com o dinheiro recebido pelos programas 13.
13 - Além disso, há assistência e acompanhamento médico.

Por esses motivos, meu voto é 13 no domingo!





Acontece ....


terça-feira, 19 de outubro de 2010

Amazônia: sob a luz da lua e o canto do capitão-da-mata!


A pedido de colegas de faculdade, que divulgam ciência no espaço cienciae, escrevi este texto sobre minhas impressões em relação à Floresta Amazônica e suas águas negras.

A postagem original pode ser encontrada no link:

http://cienciae.blogspot.com/2010/10/amazonia-sob-luz-da-lua-e-o-canto-do.html


Amazônia: sob a luz da lua e o canto do capitão-da-mata!

Sou bióloga, doutoranda, interessada em evolução, trabalhos de campo e insetos. Ao longo de minha formação acadêmica obtive experiência de campo em áreas de Cerrado e floresta Atlântica, até então a Amazônia era uma realidade distante. Mas, os acasos sucessivos que regem a vida de todos nós, deixaram saudades de uma Amazônia que pretendo voltar sempre.

Minha primeira experiência (resultado de um convite para participar de uma expedição de um mês ao alto Rio Negro, em julho de 2009) foi um tanto inusitada, por dois motivos principais: a expectativa e a decepção.

Embarquei em Campinas sorridente, muitíssimo feliz e ansiosa para conhecer esse universo chamado Amazônia. Digo universo porque não basta saber que é a maior floresta tropical do planeta, com expressiva biodiversidade associada, formada por árvores de grande porte em um solo muitíssimo pobre altamente dependente dos nutrientes resultantes da decomposição da serrapilheira. Universo porque não há livro didático e noticiário social ou científico que transmita a quem não a conhece a noção espacial exata do que é essa imensa floresta!

Em um vôo de 3h40 até Manaus, duas horas se dão sobre floresta, mata nativa intocada, e isso é apenas a porção leste da floresta, muito menor do que toda a região entre Manaus e o oeste da América do Sul (aproximadamente 2400Km). O triste é saber que voamos boa parte do tempo (aproximadamente 40 minutos) sobre área desmatada, hoje plantação de soja e algodão no Mato Grosso, e que outrora essa paisagem seria outra. Eu não sou contra ocupações humanas e sei que as plantações permitem que as pessoas comam e se vistam. O problema é como se dá boa parte dessas ocupações. Hoje se sabe que a floresta, explorada de forma adequada (p.ex. manejo sustentável da pesca, agricultura e pecuária, produção de açaí, castanha-do-pará e madeira), permite conciliar ocupação humana e áreas não desmatadas. Mas essa informação não é levada em conta na maioria das vezes, infelizmente.

A decepção, apesar do negativismo que cerca a palavra, transformou-se em um grande aprendizado humanitário. Depois de quatro dias subindo o Rio Negro em direção aos limites dos estados do Amazonas e Roraima, sob escolta de garças e botos, nosso barco naufragou nas proximidades da Comunidade São José, Igarapé do Malalahah. Felizmente nenhum ferido e poucas perdas materiais, mas não conseguimos coletar. Passamos um dia no salão de festas de uma comunidade ribeirinha, cercados pela curiosidade das crianças, pelas “guloseimas” calóricas retiradas do naufrágio, bebendo água do igarapé e comendo mandioca cozida preparada pelas mães da comunidade. Os homens não estavam presentes, exceto os mais idosos. Ficam dias na mata recolhendo piaçava (ou piaçaba), fibras utilizadas para produzir vassouras. Periodicamente voltam à comunidade para rever suas famílias e comercializar os enormes fardos de fibras. Esse dinheiro é utilizado para comprar gasolina para o gerador (utilizado para iluminar a comunidade poucas horas à noite) e mantimentos industrializados. As crianças recebem atendimento médico periódico, são alfabetizadas na escola da comunidade e muito curiosas em relação ao restante do mundo, já que há uma televisão comunitária em que assistem o Jornal Nacional e a novela das “oito” todos os dias. Depois disso as luzes se apagam e a lua cumpre o seu papel.

Posso dizer que a experiência de dormir ao relento, sob a luz da lua, ao som das águas negras e do capitão-da-mata (uma ave que tem um canto muito alto e característico) nos faz repensar profundamente nosso lugar na natureza e a maneira desleal com que o homem tem interagido com o meio ambiente.

No dia seguinte fomos resgatados por uma embarcação vinda de Barcelos, retornamos à Manaus e, por terra, fomos coletar no município de Presidente Figueiredo.

A comunidade de Figueiredo, ao contrário da que conheci no alto Rio Negro, tem energia elétrica. Mas me surpreendi ao saber que a luz na região data de 2006 (programa “Luz para todos”), em uma comunidade a apenas 70Km de asfalto de Manaus. A melhor palavra para explicar isso, a meu ver, é descaso das autoridades públicas. A mandioca e a caça são a base da alimentação e o dinheiro do “Bolsa família” é gasto com mantimentos como arroz e feijão. Todos vão à escola, inclusive os pais.

É muito interessante ver pai, mãe e filhos caminhando no meio da tarde em direção à escola e voltando tarde da noite. Como viajamos para coletar insetos, com armadilhas espalhadas ao entorno da comunidade e nas trilhas, corriqueiramente eles param nas armadilhas, perguntam, aprendem, e se perdem novamente na escuridão.

Diferente, mas interessante é ver a mata transpirar por horas após uma chuva efêmera e continuar “chovendo” em seu interior mesmo que a chuva já tenha cessado por completo. O calor e a umidade são indescritíveis, a sensação é de como se tivéssemos tomado muita chuva enquanto caminhando sob o sol por horas .... E horas ... E horas .... mesmo que não tivesse chovido.

As árvores geralmente são muito altas, com troncos finos e roliços (estioladas), galhadas apenas nas copas, de forma que a paisagem torna-se bastante repetitiva, explicando a grande quantidade de episódios em que muitos viajantes inexperientes se perdem. Mas a mata em si não é difícil de ser adentrada.

O solo é regular facilitando o acesso, muito diferente dos remanescentes de Floresta Atlântica, em que o terreno é geralmente íngreme, com predomínio de arbustos. Nada melhor que um mateiro (pessoa da região com um grande conhecimento da mata local) para nos levar aos diferentes ambientes dentro da mata (campinas, cachoeiras, igarapés, bromélias aos montes no chão, etc.) e ensinar nomes populares da natureza ao redor. É interessante notar que a paisagem não é a mesma ao longo de toda a floresta, e que a mesma não é composta apenas por áreas planas e rios calmos. Particularmente gostei do “mulateiro”, uma árvore com tronco vermelho vivo, fácil de reconhecer de longe, e da famigerada castanha-do-Pará ou castanha-do-Brasil, árvore imponente com seus ouriços repletos de castanhas.

Eu esperava caminhar pela mata e ver muitos insetos voando, pássaros, cobras, mamíferos. Mas isso é uma grande ilusão. O mateiro reconhece pegadas, mas para ver uma borboleta voando, só depois de ficarmos parados e em silêncio por um bom tempo. Isso não significa que a floresta não é rica em termos de biodiversidade. Pelo contrário, indica que qualquer mínima alteração é perceptível pelos animais e que os mesmos se escondem rapidamente. Os fatores sazonais também influenciam este tipo de observação.

Durante as coletas, o panorama geral é bem diferente. O material coletado por meio dos diferentes tipos de armadilhas é muitíssimo variável, inusitado, colorido e vistoso. Muitas espécies encontradas certamente são novas, já que a região é pouco estudada, mas isso só é confirmado após exaustivos estudos realizados por especialistas e publicados em artigos científicos.

Este ano voltei à Manaus (em junho de 2010). Dessa vez sem naufrágio coletamos ao longo das matas dos afluentes ao norte do Rio Negro. Exploramos os Rios Aracá e Padauari. As impressões dessas águas escuras ficam para uma próxima postagem.

Fotos de Sarah Oliveira, Chico Felipe e Josenir Câmara.

domingo, 19 de setembro de 2010

No reason: A World on the Verge of Water Bankruptcy

Um vídeo interessante para refletirmos a respeito da maneira desleal com que o homem lida com o meio ambiente e com o bem mais precioso da vida, a Água.
Apreciem e divulguem!




Video by Eric Daigh for Circle of Blue, Music by Carly Comando

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Sobre mosquitos ....



Os nematóceros são popularmente conhecidos como “mosquitos”. Abrangem 35 famílias de Diptera, caracterizadas pela presença de antenas longas, com muitos segmentos, frequentemente com muitas cerdas nos machos.

Os representantes mais conhecidos do grupo são os pernilongos ou muriçocas (família Culicidae), borrachudos ou piums (Simulidae), a mosca-de-banheiro e o mosquito-palha ou birigui (Psychodidae), maruins, mosquito-pólvora ou mosquitinho-de-mangue (Ceratopogonidae). O renome advém do fato de algumas fêmeas de espécies pertencentes a esses grupos serem hematófagas e, consequentemente, vetores de doenças como a malária, febre-amarela, dengue, elefantíase, leishmaniose, etc. Mas a maioria das espécies não interfere diretamente no dia-a-dia dos humanos. Sua biologia está relacionada à estrutura dos ambientes naturais, como a indução de galhas em plantas (família Cecidomyiidae), fungos e matéria orgânica em decomposição (Mycetophiliformia), flores (Bibionidae, Tipulidae) e ambientes aquáticos (Limoniidae, Trichoceridae, Chironomidae, Scatopsidae). Alguns grupos, como Chironomidae e Mycetophilidae, são utilizados como indicadores da qualidade de ambientais naturais e suas alterações. Os nematóceros adultos vivem em descampados, folhagens, florestas, mangues, cavernas, desertos, cerrados, mas normalmente são bastante dependentes de umidade. As larvas estão com frequência associadas a fungos e matéria orgânica em decomposição.

Dentre os nematóceros, um grupo relativamente abundante e relevante do ponto de vista da biodiversidade são os Bibionomorpha, conhecidos desde o Triássico (cerca de 250–210 milhões de anos atrás). Dentro desse grupo, um dos mais importantes são os Mycetophiliformia, cujo nome provém do grego myceto (= fungos) e philos (= amigo de), com tórax arqueado e pernas alongadas.

Atualmente, os Bibionomorpha abrangem onze famílias –Anisopodidae, Pachyneuridae, Bibionidae, Cecidomyiidae, Sciaridae, Diadocidiidae, Ditomyiidae, Keroplatidae, Bolitophilidae, Lygistorrhinidae e Mycetophilidae–, cujas larvas com frequência se alimentam de raízes de plantas e hifas de fungos (micélios) ou esporóforos, sendo importantes no processo de decomposição da matéria orgânica em florestas, principalmente madeira e folhas. Os adultos, por sua vez, têm vida livre, com comprimento de 2 a 10 mm, frequentemente encontrados em lugares escuros, bosques úmidos, túneis e ocos de árvores, atuando na dispersão de esporos de fungos e pólen de plantas. As espécies desse grupo são conhecidas de todos os continentes exceto da Antártida.

Representantes de muitos gêneros são capturados com puçás ou vários tipos de armadilhas de coleta de insetos, como armadilhas luminosas, Moericke, Malaise, pitfall e Shannon. Nestas últimas, frutas fermentadas costumam ser utilizadas como iscas. Madeira em decomposição e fungos podem ser coletados e mantidos em laboratório até que adultos emerjam.

A fauna neotropical ainda é pouco conhecida. Um projeto recente de estudo da biodiversidade de Diptera na Floresta Atlântica já descreveu mais de 80 espécies nunca descritas antes pela ciência, mas ainda há mais de 1000 espécies por descrever. A Amazônia ainda foi pouco estudada para muitos desses grupos, com exceção de algumas áreas e, é bastante razoável esperar que sejam coletadas mais de 100 espécies novas apenas de Mycetophilidae.

Em 2010, comemora-se o ano internacional da biodiversidade. É de conhecimento geral que grande parte da diversidade no planeta está sendo perdida antes mesmo de ser conhecida. Os micetofilídeos são comuns em ambientes florestais úmidos. A precipitação média em ambientes de florestas exerce forte impacto na quantidade de fungos e, portanto, tem influência nas populações de micetofilídeos. Assim, a presença de representantes desse grupo em certas áreas pode ser um indicador da qualidade ambiental.

Cabe aos museus de história natural coletar, armazenar, preservar, organizar e conhecer a diversidade biológica. Boas coleções permitem também mapear a distribuição espacial dos organismos vivos e compreender suas relações evolutivas. Na região Amazônica, a maior coleção pertence ao Instituto de Pesquisas Amazônicas (INPA), que nos últimos anos fez um grande investimento em qualidade e quantidade, tornando-se uma das instituições mais importantes na América do Sul nessa área. Na Floresta Atlântica merece destaque a coleção do Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo, que apesar do renome internacional, não tem recebido a mesma atenção por parte da sociedade brasileira. Na região Suo destaca-se a coleção da Universidade Federal do Paraná e, infelizmente, nenhuma instituição museológica pode ser remetida ao bioma do Cerrado, que está sendo destruído antes mesmo de ser inventariado.


Fotos: Sarah S. Oliveira
Schnusea aguarasi, Dziedzickia medea, Dziedzickia coheri

sábado, 14 de agosto de 2010

Acontece ....

Os pós-graduandos do programa de Entomologia da Universidade de São Paulo – campus Ribeirão Preto realizam, há 9 anos, o Curso de Verão em Entomologia. Desde a sua primeira edição, em 2003, o curso tem sido voltado aos alunos de graduação de diferentes áreas das Ciências biológicas. Participem!




Informações: sites.google.com/site/veraoentomologia
veraoentomologia@gmail.com

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Megadiversidade em insetos: causas e história - Parte II

Este texto foi produzido por alunos do 1° ano de Biologia da USP-RP na disciplina "Seminários Integrados I". Como o texto é interessante e tem tudo a ver com o conteúdo discutido neste blog resolvi postá-lo em duas partes. Apreciem! - Continuação ....

Megadiversidade em insetos: causas e história

Por Carolina Gennari Verruna, Fernando Figueiredo Mecca, Gabriel José Teixeira e Gabriela Molinari Roberto.

Desenvolvimento Ontogenético

Os insetos podem apresentar três tipos de desenvolvimento:
Ametábolo: quando o indivíduo nasce semelhante ao adulto, exceto quanto aos órgãos reprodutivos que ainda não estão maduros, não sofrendo, portanto, nenhum tipo de metamorfose;
Hemimetábolo: quando o indivíduo jovem, conhecido por ninfa, sofre pequenas modificações como o desenvolvimento de asas, além da maturação dos órgãos reprodutivos, até chegar à idade adulta, sofrendo, portanto, uma metamorfose denominada incompleta;
Holometábolo: quando o indivíduo passa pelo estágio de larva e pupa até chegar à idade adulta, sendo submetido, nessas passagens, a uma grande mudança na sua morfologia e anatomia, sofrendo, assim, o que denominamos metamorfose completa (Grimaldi & Engel, 2005).

Alguns pesquisadores acreditam que os estágios de proninfa e ninfa no desenvolvimento hemimetábolo seriam homólogos aos estágios de larva e pupa, respectivamente, no desenvolvimento holometábolo (Truman & Riddiford, 1999).

As espécies de insetos holometabólicas constituem os Endopterygota que abrange as maiores ordens de insetos, em sentido numérico, constituindo cerca de 85% das espécies de deste grupo, segundo Grimaldi & Engel (2005).

Com relação à diversidade do grupo Endopterygota, a importância do desenvolvimento holometábolo muito provavelmente está relacionado à diminuição da competição intra-específica, pois o indivíduo adulto possui nicho ecológico diferente do da larva, não competindo então pelos mesmos recursos ambientais (Rupert & Barnes, 1996; Grimaldi & Engel, 2005). Também aponta-se que os Endopterygota podem ter mostrado menores índices de extinção durante os eventos ocorridos no final do Cretáceo (Ross et al.(2000) apud Mayhew, 2007), fato que teria levado a uma maior diversidade desses insetos em relação às outras ordens de Hexapoda. Entretanto não é possível afirmar que a holometabolia é a única responsável pela grande diversidade de algumas ordens de insetos sobre a outra, visto que existem ordens de hemimetábolos com maior número de espécies que outras ordens de holometábolos, como nota-se ao comparar, por exemplo, a ordem Mecoptera de holometábolos com a ordem Hemiptera de hemimetábolos.

Idade do grupo Insecta

A definição para o que é um registro fóssil é muito vaga. Pode ser considerado um fóssil algo morto e preservado há quanto tempo? Ou só existem fósseis de espécies extintas? Uma definição clara e objetiva é que fósseis são “partes do corpo” de qualquer espécie, ainda vivente ou extninta, que foi naturalmente preservada por milhares de anos (Grimaldi & Engel, 2005).

Exceto por alguns poucos corpos de vertebrados que são encontrados congelados ou mumificados, são encontrados apenas ossos e dentes que não possuem mais que alguns poucos milhões de anos. Já os insetos são conservados quase que inteiros, por exemplo, em âmbar e em certos minerais ou resinas de algumas árvores (Schopf, 1975 apud Grimaldi & Engel, 2005).

Além disso, podemos comparar os escleritos e as asas aos ossos e aos dentes, devido sua longa durabilidade, sofrendo muito pouco com os processos de degradação naturais.

As condições como um fóssil é formado são muito importantes para sua preservação e posteriores estudos. Locais profundos, gelados e sem umidade, por exemplo, mantêm os exemplares com um grau elevado de conservação, diferente de lugares pouco profundos, úmidos e com alta concentração de oxigênio (Grimaldi & Engel, 2005).

O registro fossilífero dos Insecta, apesar de ser um pouco lacunoso, remete a origem do grupo há milhões de anos. O fóssil mais antigo até então achado de um inseto data de 408 a 438 milhões de anos atrás, no período Devoniano, se tratando de um Rhyniognata hirsti (Grimaldi & Engel, 2005). O espécime possuía mandíbula triangular e com ranhuras semelhantes a dentes, provavelmente com a mesma função que estes. Estudos mostraram também resquícios de asas, levando os sistematas a classificarem a espécie como sendo próxima dos Pterygota. Tal caráter leva a crer que os insetos teriam surgido no período anterior, o Siluriano, há cerca de 443 milhões de anos, fazendo deles um dos animais mais antigos a colonizar a terra firme, podendo ser uma das razões para a enorme diversidade e quantidade de espécies no grupo (Grimaldi & Engel, 2005).

Relações ecológicas com angiospermas

O grupo Insecta possui diversas relações inter-específicas com o reino Plantae. Entre elas, podemos citar: abrigo e proteção (insetos podem se esconder de predadores adentrando nas cascas ou buracos de árvores ou até mesmo fazer destas suas moradias), fitofagia (tendo em sua maioria espécies herbívoras, como exemplos, larvas de borboletas – Lepidoptera – que se alimentam das folhas ou cupins – Isoptera – que se alimentam da madeira) e polinização (entomofilia). Podem ser citados vários exemplos de folhas que foram fossilizadas com algumas marcas, minas, sem algumas partes ou com restos fecais que comprovam a existência de algumas espécies em certos períodos mesmo não possuindo fósseis dos mesmos (Grimaldi & Engel, 2005). A maioria dessas relações se dá com o grupo das angiospermas.

Estima-se que as Angiospermas tenham surgido por volta de 160 milhões de anos atrás, no Jurássico Inferior. Portanto, até então, as grandes florestas eram formadas por gimnospermas, principalmente coníferas e cicadáceas. Sabe-se que nessa época já estavam presentes aproximadamente 80% das famílias de insetos ainda existentes (Grimaldi & Engel, 2005). Dessa forma, ao contrario do popularmente dito, a entomofilia não se apresenta como um caráter significativo para a diversificação dos insetos, mas sim para as Angiospermas, que com isso obtiveram grande sucesso reprodutivo, alta variabilidade genética e dispersão.

Além disso, sabe-se que apenas seis das 31 ordens de Hexapoda abrigam espécies polinizadoras. Vale ressaltar que mesmo nessas ordens, um número relativamente pequeno de espécies apresenta entomofilia. Dessa forma, é fácil excluir a hipótese de que a polinização tenha sido de grande importância para a diversificação do grupo. Entretanto, não devemos nos esquecer da importância das outras interações entre estes dois grupos, tendo certamente favorecido a ambos no que diz respeito à diversificação e aumento de biodiversidade.

Extinções e diversidade relativa

Como um grupo tão antigo, os insetos já passaram por diversos eventos de extinção. Tais eventos também contribuíram de alguma forma na diversificação dos insetos e a compreensão desses processos também é importante para se compreender a constituição atual do grupo. Isso porque quando certa espécie é extinta, surge uma possibilidade para outras espécies já existentes se diversificarem.

O primeiro grande evento de extinção, e também o maior, pelo qual o grupo passou foi o da extinção Permo-triássica, no qual a maior parte da vida no planeta foi extinta. Entretanto, apenas algumas ordens de insetos foram extintas, como os Palaeodictyoptera e os Protodonata. A maioria das ordens até então existentes, contudo, deixou representantes (Grimaldi & Engel, 2005).

O último grande evento de extinção pelo qual os insetos passaram foi a extinção do “K-T” (Cretáceo-Terciário), na qual a maior parte dos dinossauros foi extinta. Os insetos sofreram relativamente pouco com tal evento e poucas linhagens foram extintas (Grimaldi & Engel, 2005).

Portanto, observamos que as extinções contribuíram de duas formas para a diversificação do grupo, sendo uma delas a ocupação de novos nichos, e a outra o fato de que, como poucos insetos foram afetados por esses grandes eventos, a diversidade de insetos apresenta-se relativamente muito grande, visto que os outros organismos sofreram mais em tais períodos.

Biogeografia do grupo

Outro fator que pode ter contribuído muito na diversidade foram os eventos de vicariância pelos quais os insetos passaram. Vicariância pode ser explicada como sendo um processo de evolução biogeográfica que se caracteriza pelo surgimento de uma barreira geográfica (o surgimento de uma montanha, ou mesmo a separação dos continentes), que divide a área ocupada por uma determinada população em duas ou mais novas áreas. Com o tempo, essas populações sofrem pressões distintas e tendem a se tornar espécies diferentes (Amorim, 2009).

Alguns exemplos do processo podem ser citados, como a elevação do nível do mar, que separa pequenas populações por um período suficientemente longo para que possam se tornar mais de uma espécie. Depois que o nível desce, elas passam a interagir como espécies distintas, e se novos eventos ocorrerem, novas espécies poderão surgir.

Um grande exemplo que pode ser citado é o da fragmentação da Pangea até a conformação atual dos continentes. No período Triássico, a maioria das ordens de insetos já estava presente e distribuída pelo grande continente (Gimaldi & Engel, 2005). Foi nesse período que se iniciou a fragmentação (há cerca de 200 milhões de anos), levando à formação da Laurásia ao norte e da Gondwana ao sul ao fim do Jurássico. A fragmentação persistiu até o Cretáceo, onde houve a formação da maior parte dos continentes atuais (Tassinari, 2000). Cada uma dessas fragmentações representou um evento de vicariância, resultando em inúmeros eventos e, portanto, um aumento mais que significativo no número de espécies.

Conclusão

Analisando todos os fatores citados, é possível entender que o grande número de espécies de Insecta não pode ser atribuído a um único fator, mas sim a um conjunto de fatores. A presença de asas parece ter sido relevante para a diversificação do grupo, mas existem grupos muito diversos ápteros, e outros grupos alados com menor diversidade. Padrão semelhante se encontra quando notamos que várias ordens de Neoptera são muito numerosas, apesar de algumas apresentem poucas espécies. Também percebemos este tipo de dado quanto à holometabolia: apesar de as maiores ordens de insetos estarem inseridas nos Endopterygota, este grupo abriga outras ordens muito menores, e existem grupos bem numerosos com desenvolvimento hemimetábolo.

Portanto, todos esses fatores, somados com a idade do grupo e a conseqüente passagem por diversos eventos de vicariância, pequeno número de linhagens extintas nos grandes eventos de extinção e outras características não citadas anteriormente, como o curto ciclo reprodutivo, que propicia a fixação de mutações, explicam conjuntamente a megadiversidade de insetos que podemos observar.

Referências Bibliográficas
Amorim, D.S. (2009), Fundamentos de Sistemática Filogenética. Holos, Editora Ltda.
Chapman, A.D. (2009). Number of living species in Australia and the World. 2nd ed. Australian Government – Department of the Environment, Water, Heritage and the Arts.
Gillott, C. (2005). Entomology. University of Saskatchewan: Springer Press.
Grimaldi, D., & Engel, M.S. (2005). Evolution of the insects. Cambridge University Press.
Mayhew, P.J. (2007). Why are there so many insect species? Biological Reviews, 82, 425-454.
Rupert, E.E., & Barnes, R.D. (1996). Zoologia dos Invertebrados. Editora Roca.
Tassinari, C. C. G. (2000). Tectônica Global. In: W. Teixeira; T. Fairchild; M.C. Toledo. (1 ed.). Decifrando a Terra (pp. 97-112). São Paulo: Oficina de Textos.
Truman, J.W., & Riddiford, L.M. (1999). The origins of insect metamorphosis. Nature, 401, 447-452.

sábado, 24 de julho de 2010

Megadiversidade em insetos: causas e história -Parte I

Este texto foi produzido por alunos do 1° ano de Biologia da USP-RP na disciplina "Seminários Integrados I". Como o texto é interessante e tem tudo a ver com o conteúdo discutido neste blog resolvi postá-lo em duas partes. Apreciem!

Megadiversidade em insetos: causas e história

Por Carolina Gennari Verruna, Fernando Figueiredo Mecca, Gabriel José Teixeira e Gabriela Molinari Roberto.

Resumo
A classe Insecta abriga uma enorme quantidade de espécies catalogadas – na verdade, é de longe o grupo com mais espécies descritas. Essa enorme proporção de diversidade nos instiga a pergunta: por que existem tantos insetos?
Através de analises em diversos aspectos, com comparações entre grupos da filogenia dos Hexapoda e seus respectivos números de espécies, combinados com a observação de características morfológicas, fisiológicas e ecológicas, além do estudo da história biogeográfica dos insetos, investigamos mais detalhadamente os aspectos responsáveis por essa grande diversidade, observando que nenhum caractere sozinho é responsável por essa diversidade, mas sim a soma de muitos deles.

Palavras-chave: Insetos; megadiversidade; diversidade; Insecta.

Diversidade e relações filogenéticas
Analisando a diversidade de seres vivos no planeta, os insetos se sobressaem quanto ao número de espécies. Dentre cerca de 1,9 milhões de organismos já descritos (Chapman, 2009), aproximadamente 925 mil pertencem a essa classe (Grimaldi & Engel, 2005), distribuídos de forma desigual em 31 táxons colocados ao nível de ordem. Essas ordens apresentam uma enorme variedade interna, com diferentes adaptações em sua morfologia e função. Por exemplo, existem aparelhos bucais sugadores encontrados em Lepidoptera, mordedores em Coleoptera e cortadores em Hymenoptera; asas de diferentes formatos, tamanhos, por vezes modificadas em halteres, tanto em Diptera como Strepsiptera; diferenças entre as ordens quanto à espessura do exoesqueleto e tamanho do corpo. Isso resulta em uma enorme diversidade de formas e comportamentos, distribuídos por praticamente todos os habitats conhecidos – desde desertos equatoriais tórridos e montanhas vulcânicas, até regiões glaciais nevadas; desde o alto das copas de florestas tropicais até os diferentes estratos do solo, ora profundas ora superficiais, ou vivendo no interior de árvores ou em ambientes aquáticos lóticos ou lênticos.
Ao analisar a filogenia do grupo com o número de espécies em cada uma das ordens (Fig. 1), pode-se chegar a algumas conclusões incorretas sobre essa distribuição, afirmando, por exemplo, que a diversidade de alguns grupos se deve somente a presença de asas ou a ocorrência de holometabolia.
Alguns grupos na filogenia dos Hexapoda serão recorrentemente citados durante todo o debate aqui proposto, de modo que é pertinente caracterizá-los previamente, mesmo que de forma sumária. Pterygota é o grupo que inclui todos os insetos dotados de asas (com alguns casos perda secundária, como nos Siphonaptera – pulgas –, entre outros, apresentados mais tarde).

Os Neoptera são o sub-grupo de pterigotos dotados de asas capazes de se dobrar umas sobre as outras, sobre o abdômen, por causa da articulação dos escleritos que ligam as asas com o tórax. Nos “Palaeoptera”, as asas são conectadas ao corpo por escleritos fundidos, de modo que não podem dobrar-se umas sobre outras. Outro grupo importante na história evolutiva dos hexápodos são os Endopterygota, que abriga todos os insetos holometábolos, ou seja, os que possuem metamorfose completa (estágios de ovo, larva, pupa e adulto). Quais seriam as causas que teriam propiciado uma diversidade tão grande desses e de outros grupos de insetos, tanto em relação entre as ordens como em relação a outros grupos?

Figura 1: Filogenia dos Hexapoda, baseada em dados de Grimaldi & Engel, 2005. A distribuição de número de espécies em cada ordem pode levar a impressões como a de que todas as ordens megadiversas estão entre os Holometabola ou de que as asas são cruciais para a alta diversidade. No decorrer deste trabalho, será explicado por que essas impressões são falsas

Morfologia
A morfologia dos insetos, como dito anteriormente, mostra uma variação muito grande entre as ordens. Cabe saber se alguma dessas características morfológicas, presente em um ancestral, teria sido a responsável pelo destaque desse grupo em termos numéricos. Tais características poderiam ter propiciado um aumento na biodiversidade desses grupos em relação aos demais.
Os insetos são animais segmentados, ou seja, compostos por uma série de unidades repetitivas chamadas de metâmeros, que unidas formam uma organização corporal com três tagmas, sendo eles: cabeça, tórax e abdômen (Grimaldi & Engel, 2005). Distinguem-se dos outros artrópodes por possuírem um par de antenas e olhos compostos na cabeça, tagma responsável por funções sensoriais onde está presente também a mandíbula que varia de acordo com o hábito alimentar do inseto. Três pares de pernas e geralmente dois pares de asas na região torácica, responsável pela locomoção do inseto; na região abdominal, por fim, concentram-se as funções viscerais, ligadas à digestão e à reprodução (Rupert & Barnes, 1996).

Por serem artrópodes, os insetos também possuem um exoesqueleto quitinoso que fornece proteção contra desidratação, raios ultravioletas e impactos mecânicos, além de suporte e auxílio na locomoção (Grimaldi & Engel, 2005). Algumas regiões do exoesqueleto são mais esclerotizadas que outras, ou seja, possuem maior espessamento por quitina. Essas partes recebem o nome de escleritos e são separadas por suturas, regiões menos esclerotizadas, portanto mais flexíveis. (Rupert & Barnes, 1996).

Existe grande variação quanto à espessura do exoesqueleto. Por exemplo, os besouros, (ordem Coleoptera) possuem um exoesqueleto extremamente rígido, enquanto os piolhos (ordem Phthiraptera) possuem um exoesqueleto relativamente frágil. Mas que relação se pode estabelecer com a diversidade dos insetos? Se analisarmos a filogenia (Fig. 1) veremos que os Coleoptera são muito mais diversos em número de espécies do que os Phthiraptera podendo se estabelecer uma suposta relação de que, quanto mais rígido o exoesqueleto, maior é a proteção mecânica que ele confere e portanto maior a chance de sobrevivência do inseto.Na natureza existem insetos ápteros e alados (Pterygota), sendo possível observar a predominância numérica do segundo em relação ao primeiro, sugerindo que as asas teriam sido uma adaptação evolutiva que permitiu maior diversificação dos grupos que as portam.

Em relação ao surgimento das asas, verifica-se que, quanto à seqüência de processos evolutivos que deram origem a elas, não existe concordância entre os autores, além de o registro fossílifero ser limitado, pois são encontrados tanto fósseis de insetos ápteros como alados, mas não um fóssil de um organismo que representasse um tipo intermediário entre essas duas formas (Rupert & Barnes, 1996). Afora isso, eventos que ocorreram nesse tempo passado não podem ser, a rigor, propriamente conhecidos, mas apenas hipóteses de como elas teriam acontecido podem ser formuladas.

As duas principais hipóteses a respeito da origem da asa e evolução do vôo são a paranotal e a epicoxal. A primeira postula que as asas teriam origem a partir de projeções laterais rígidas do noto do tórax que foram gradualmente aumentando. Projeções como essas podem ser encontradas no fóssil de Stenodictya lobata (Fig 2). A segunda afirma que elas teriam provindo do desenvolvimento do exito da epicoxa, que no organismo ancestral desempenharia o papel de brânquias (Gillott, 2005).
Figura 2: representação gráfica de um Stenodictya lobata (Grimaldi & Engel, 2005).

Na filogenia, o caráter “presença de asas” separa o grupo monofilético Pterygota (mesmo que alguns de seus membros tenham secundariamente perdido as asas por processos de reversão) do restante dos insetos (Rupert & Barnes, 1996) e abrange quase todas as ordens de Insecta. Sabe-se que a presença de asas auxiliou na movimentação, potencializou o acesso a novas fontes de alimento além de auxiliar na fuga de predadores (Rupert & Barnes, 1996). Entretanto, não se pode afirmar que a asa foi a única responsável pelo domínio de Pterygota, pois dentre eles alguns grupos alados são menos diversos que os grupos ápteros, por exemplo os Phthiraptera ápteros são mais diversos que os alados Mantodea (louba-a-deus).

Os Pterygota são divididos em “Palaeoptera” e Neoptera, sendo o primeiro um grupo parafilético (composto pelas ordens Odonata – onde se encontram as libélulas – e Ephemeroptera) e o segundo um grupo monofilético cuja sinapomorfia é um conjunto de características associadas à capacidade de dobrar as asas umas sobre as outras sobre o abdômen (Grimaldi & Engel, 2005).

O que causa essa diferença é o fato de que nos “Palaeoptera” a articulação constituída com a asa se dá através de placas auxiliares que estão fundidas (Grimaldi & Engel, 2005). Diferentemente, os Neoptera possuem os escleritos da base da asa articulados. Esse grupo abriga a maior parte das ordens de Pterygota.

Considera-se que a capacidade de dobrar as asas de Neoptera teria sido muito relevante por permitir a irradiação dos insetos em micro-habitats, como buracos no solo ou em cascas de árvores, lugares onde as asas esticadas seriam um obstáculo. Além disso, acredita-se que o dobramento alar foi acompanhado pela redução corporal de várias ordens (Rupert & Barnes, 1996).

terça-feira, 20 de julho de 2010

terça-feira, 18 de maio de 2010

Silêncio no Butantan.

Sábado (15 de maio de 2010) um incêndio dizimou a coleção do Instituto Butantan, em São Paulo. Um acervo de mais de 100 anos foi perdido e uma dor profunda acometeu a comunidade científica e funcionários do instituto. Porém, a mídia e a população em geral ainda não conseguem relacionar a importância das coleções científicas com a produção do conhecimento. Mais uma vez, como já comentado neste blog, a divulgação científica de qualidade é o melhor caminho para conscientização. Os pesquisadores, além de tudo, são formadores de opinião, e esta tarefa não pode ser deixada de lado.

Uma carta, escrita por Alessandra Bizerra (pesquisadora do Butantan), traz uma reflexão interessante sobre a produção de conhecimento e a maneira como a sociedade recebe nossos resultados. Eu, como taxonomista, lamento profundamente o acontecido. As palavras .... realmente me faltam.

Nós perdemos.
Neste sábado, dia 15 de maio de 2010, perdemos acervos valiosos no Instituto Butantan. O fogo levou um patrimônio que não poderá ser recuperado. Não sobrou quase nada para contar história. Não teremos de volta as dezenas de espécimes-tipo que foram queimadas ou os pouquíssimos exemplares coletados até hoje de uma espécie raríssima de boídeo, nem aquela cobra cega (seria ela hermafrodita?) que não existe em nenhuma outra coleção. Não teremos de volta as mais de 1,5 milhões de serpentes que foram entregues pela população ou coletadas por centenas de funcionários em viagens de campo e resgates de hidrelétricas durante mais de 110 anos. Nem os 450.000 artrópodes que foram retirados de seus ambientes de origem, muitos ainda a serem descritos. E o pior, não teremos de volta um registro histórico de uma época em que a população estabelecia um vínculo direto com a pesquisa, em que milhares de fornecedores foram responsáveis por influenciar os caminhos de pesquisa de uma instituição como o Butantan.
Garanto que maior do que a dor, hoje, é a revolta. Revolta por saber que a pesquisa básica neste país é negligenciada, revolta por saber que essa perda poderia ter sido evitada, revolta por saber que outras coleções e acervos correm o mesmo risco, revolta por ver que nada mudará.

As reportagens televisivas mostraram o incêndio, mas terminaram suas falas com as frases: "O Butantan produz 80% das vacinas e soros brasileiros. Esse serviço não foi afetado!" Como assim??!!! Quando perceberemos que para produzir soros, vacinas e biofármacos, precisamos de pesquisas, muitas delas feitas a partir de coleções como a que perdemos ontem? Quando consideraremos importantes as produções de conhecimento que não sejam unica e exclusivamente dirigidas à produção de bens de consumo imediato?

Estou triste, com dor, e muito indignada. Ainda mais por saber que a próxima notícia (que durará por volta de umas duas horas na mídia) será a perda de uma biblioteca inteira ou de qualquer outro acervo de nossas instituições de pesquisa.
Esse é o nosso país, local em que nossos patrimônios são destruídos, todos os dias, indefinidamente...

Desculpem, queridos, mas estou indignada, não somente como pesquisadora que analisou mais de 600 exemplares dessa coleção durante o mestrado e traçou uma de suas possíveis histórias durante o doutorado, mas como cidadã que vê o descaso de nossos governantes (e de todos nós) perante o patrimônio cultural, aí incluso o científico, desse país!

Abraços a todos,

Alessandra Bizerra

Pesquisadora Científica do Museu de Microbiologia do Instituto Butantan.

quinta-feira, 6 de maio de 2010

Luzes de alerta!


Uma notícia de divulgação científica chamou-me a atenção hoje: Luzes de alerta, não só pelo fato de um ambiente como o Cerrado restringir-se aos livros didáticos (basta viajar pelo planalto central para averiguar isso), mas principalmente por mostrar como a Sistemática é sim o cerne de toda a biologia. Nessa matéria, é possível encontrar, além de todo apelo emocional, social e econômico pela preservação do Cerrado, aspectos de taxonomia alfa, relações ecológicas, bioquímica e farmacologia e, acima de tudo, evolução.

Como assim evolução? Evolução sim.

A enzima luciferase (relacionada aos processos de bioluminescência) é encontrada em certas espécies de insetos, algas, peixes, bactérias, fungos, celenterados, anelídeos e artrópodes, sendo os vaga-lumes os mais conhecidos. Será que essa enzima é a mesma em todos esses grupos, ou seja, são homólogas? Sabe-se que esses grupos compartilham um ancestral comum remoto e que os processos bioquímicos de produção e atuação dessas enzimas são os mesmos. Mas também se sabe que cada um desses grupos pertence a linhagens evolutivas diferentes e que, mesmo dentro de cada grupo, apenas algumas espécies apresentam a característica bioluminescente.

O problema das homologias não é recente em sistemática. Algumas proposições, como homologias primárias e secundárias (p.ex. de Pinna, 1991), tornaram-se ícones e acabam dificultando a inserção de novos pensamentos em um panorama evolutivo. Hoje, com o desenvolvimento da biologia do desenvolvimento e da evo-devo, é possível pensar em homologias profundas, em características homoplásticas como resultado de um processo evolutivo do qual as características são sim compartilhadas em um nível mais remoto da filogenia, e não mais como erro procedimental. Os estudos genéticos permitiram mostrar a existência de conjuntos gênicos homólogos compartilhados pelos mais variados níveis da filogenia. Isso só reforça a idéia da Sistemática como unificadora de toda a Biologia, pois permite compreendermos os processos biológicos e a diversidade que nos cercam com base em um arcabouço histórico-evolutivo, seja na ecologia, bioquímica, genética, taxonomia, fisiologia, entre outras áreas.

Num primeiro momento é difícil pensar na espécie humana como um animal como todos os outros, inserido em um contexto histórico-evolutivo de milhões de anos. Compreendido isso, torna-se mais difícil ainda não interpretar toda e qualquer ação humana como natural. Nenhuma espécie sobrevive sem interagir com o ambiente. É biologicamente impossível uma vez que a composição de qualquer organismo vivo e o próprio surgimento da vida relacionam-se aos chamados compostos abióticos (p.ex. luz, solo, temperatura e água). O Cerrado não será trazido de volta, mas é possível, por meio de divulgação científica e do desenvolvimento de um pensamento evolutivo, conscientizar a população sobre o ambiente que a cerca e sobre a necessidade urgente de exploração racional de qualquer recurso natural.

quinta-feira, 1 de abril de 2010

A ciência esquecida de Leon Croizat

Como já comentado neste blog (incluindo em sua nota de abertura), este foi criado com o intuito de divulgar ciência sem perder de vista o conteúdo evolutivo que sustenta e abarca toda a Biologia.

O nome do blog "Forma, tempo e espaço" relaciona-se a uma das obras do naturalista italiano Leon Croizat (1894-1982), segundo o qual a diversidade biológica (forma) sofreria modificações ao longo do tempo e o mesmo aconteceria com as áreas nos quais esses organismos se distribuem (espaço), ou seja, forma e espaço evolutem juntos ao longo do tempo!

O texto que se segue foi escrito por Gustavo Miranda, do blog Devaneios Biológicos, e conta um pouco da vida e da obra de Leon Croizat.

Atualmente, o grau de qualidade de um pesquisador é medido pela quantidade de artigos científicos publicados e se pelo menos alguns deles foram feitos em revistas de alto fator de impacto. Quase que comprovadamente, quem possui muitas publicações é considerado um pesquisador de grande qualidade e renome no meio científico, enquanto que o contrário, não tem tanto impacto assim. Muitas vezes isso pode ser considerado verdade, uma vez que os vários órgãos de fomento à pesquisa fazem com que quase todos tenham dinheiro suficiente para conduzir seus trabalhos, e, com isso, produzir resultados. Uma pessoa pobre ou de classe média que sozinha nunca conseguiria conduzir uma vida de cientista por ter que trabalhar e sustentar uma família ou a si mesmo, com esse tipo de apoio financeiro é capaz de alcançar o mundo acadêmico, contando é claro com muito esforço e um pouco de sorte.

Numa época não muito distante da nossa, em meados do século XIX, a quantidade de publicações muitas vezes não condizia com a qualidade do pesquisador. O valor científico dos manuscritos é que revelava a qualidade do cientista. Prova incontestável disso foi Charles Darwin, que em sua vida, além de publicar o livro A origem das espécies, escreveu pouco mais do que sobre cracas, movimento das plantas e minhocas. Porém, pela revolução causada por sua teoria (a da seleção natural), Darwin passou a ser um dos ícones da Biologia, muito mais que Alfred Russel Wallace, o outro autor da mesma teoria que, entretanto, é o primo pobre da história.

Como o ano da teoria da evolução já passou, podemos trocar um pouco de assunto e adentrar outros campos da Biologia. Apesar de a área de estudo mudar, o apreço por cientistas com muitas publicações e possuidores de uma condição monetária elevada continua. Leon Croizat foi uma das vítimas dessa injustiça acadêmica. Nascido na Itália em 1894, filho de comerciantes, e apaixonado pelas ciências naturais, Croizat não pôde seguir o natural caminho de um estudante para a universidade. Em 1914 foi convocado para servir o exército italiano na primeira guerra mundial.

Passada a guerra de trincheiras, Croizat pôde finalmente entrar na universidade graças a condições especiais dadas a veteranos de guerra, graduando-se em direito na universidade de Turim. Em 1922, época em que se preparava para fazer seu PhD e finalmente estudar as ciências naturais, foi forçado a abandonar seu país por razões políticas devido ao fascismo introduzido na Itália.

Em 1923, Croizat se instala nos Estados Unidos e enfrenta a severa realidade de um imigrante. Durante consideráveis quinze anos, realiza trabalhos precários e passa por tempos difíceis até finalmente conseguir um trabalho temporário na Universidade de Harvard. Ele tinha a função de mapear o terreno de Arboreto Arnold, localizado na própria universidade, trabalho este que foi a porta de entrada de Croizat na carreira científica. Terminado o mapeamento ele conseguiu um emprego de assistente técnico na instituição. Nos horários livres, se deleitava em uma das maiores coleções de plantas do mundo e uma das mais magníficas bibliotecas do planeta. Aos quarenta e quatro anos, Leon Croizat finalmente iniciava seu tão sonhado estudo do mundo natural.

Croizat mergulhou profundamente no estudo da botânica, sozinho e sem orientação. Conhecia por autodidatismo todas as línguas importantes da época e decidiu entender todo o pensamento da botânica ocidental desde seu início no século XVII. Comprometeu-se ainda a entender os padrões de distribuição geográfica de todas as plantas do mundo. Dedicou-se a esse trabalho durante dez anos (1938 a 1947) e anotava tudo o que lia, pensava ou percebia em diversos cadernos, que no final de sua pesquisa se espalhou por nada menos que quatrocentos volumes.

Com esse estudo, Croizat pôde analisar a distribuição de praticamente toda diversidade vegetal conhecida na época e comparar seus resultados com a distribuição de outros grupos, como minhocas, moluscos e aves. Logo ele percebeu que haviam padrões de distribuição repetidos entre as biotas. Na época, a idéia dominante era a do dispersionismo que propunha que os organismos tinham um centro de origem e desse ponto se dispersavam para outros lugares do planeta, sendo sua distribuição atual o resultado dessa dispersão. Porém, sua percepção foi além do senso comum.

Croizat se questionava como espécies de organismos com biologia e ecologia tão diferentes, seguiam padrões de dispersão tão semelhantes. Sua conclusão se baseou numa mudança revolucionária de perspectiva. Ele concluiu que não eram as biotas que se moviam juntas entre os continentes, mas os continentes que se moviam carregando as biotas consigo. Sua idéia deu grande suporte a teoria de Wegener da deriva continental, que na época estava em profundo descrédito. Indiretamente, Croizat conseguiu apenas com dados biológicos, provar uma teoria da geologia.

Prestes a completar dez anos em Harvard e conseguir estabilidade em seu cargo no emprego, Croizat foi demitido. Com isso, esvaiu-se sua chance de publicar a idéia pela universidade. Novamente encontrava-se sem emprego, sem diploma de biólogo, sem publicações, mas desta vez, com uma idéia revolucionária. Suas qualificações não o reputavam o bastante para conseguir bom emprego. Por sorte, conseguiu cargo como professor na universidade de Caracas, na Venezuela. Sua primeira posição acadêmica conseguida aos cinquenta e três anos.

Em Caracas, Croizat pôde finalmente colocar seus pensamentos em ordem. Ele postulava que as biotas atuais derivam de biotas ancestrais que se dividiram em resposta a mudanças geográficas, produzindo espécies vicariantes. A palavra vicariante tem sua raiz no italiano e significa representante. Espécies vicariantes já eram reconhecidas desde os tempos de Darwin e Wallace, mas foi Croizat quem fez uma análise das biotas como um todo. Sua tão revolucionária visão foi então denominada por ele mesmo de pan-biogeografia (biogeografia do todo). Ele não considerava sua idéia uma teoria, mas sim um método para se estudar padrões biogeográficos.

Dedicou-se então dez anos escrevendo volumosos livros, alinhando sequências de exemplos de variados grupos de plantas e animais, produzindo, finalmente, seu primeiro manuscrito, Panbiogeography, com cerca de mil páginas em três volumes. Porém, como pudemos observar até agora, a sorte não costumava andar muito ao lado de Croizat. Após pronto seu laborioso trabalho, nenhuma editora se interessou em publicar seus livros.

Contudo, devido a sua grande teimosia, Croizat pegou suas sacrificadas economias e publicou o livro de seu próprio bolso no ano de 1958, aos sessenta e quatro anos. No ano de 1964, publicou outro livro também com seu próprio dinheiro chamado Space, time, form: the biological synthesis, referente às suas idéias.

Após esses eventos de sofrido sucesso, Croizat finalmente começou a ser reconhecido na biogeografia mundial e a publicar artigos em revistas, apesar de serem de baixo prestígio. Provavelmente devido a sua adiantada idade, Croizat era avesso a novas idéias. Como exemplo, a teoria da tectônica de placas que surgiu na década de 60, afirmou definitivamente que seu método estava correto, porém, foi terminantemente refutada por ele. O surgimento da sistemática filogenética de Willi Hennig, que somado às suas idéias foi capaz de reconstituir a distribuição atual dos organismos, como fizeram Gareth Nelson, Norman Platnick e Donn Rosen, fazendo surgir a Biogeografia de Vicariância, também não foi aceita por um Croizat já com oitenta anos. Por causa dessas aversões à novidades, é considerado um dos cientista mais controversos da biologia do século XX.

Com isso, a figura de Leon Croizat foi gradualmente sendo ofuscada pelas novas e modernas teorias propostas por Nelson, Platnick, e Rosen o que fez com que a ciência e a história pouco a pouco o esquecesse. Porém, como bem disse Fernando Fernandez em seu livro O Poema Imperfeito, “essa figura serve como um maravilhoso exemplo para nos inspirar neste mundo atual no qual o mérito tantas vezes parece tão pouco valorizado, e os sonhos, tão distantes”.

Referências Bibliográficas:
FERNANDEZ, F., 2004. O poema imperfeito: Crônicas de Biologia, Conservação da Natureza e seus Heróis. Ed. UFPR, 257 pp.
COLACINO, C., 1997. Léon Croizat’s Biogeography and Macroevolution, or … “Out of Nothing, Nothing Comes”. Philipp. Scient. 34 (1997):73-88.

domingo, 21 de março de 2010

Que espécie é esta?

Acho que todo biólogo alguma vez na vida já se deparou com a seguinte pergunta: “que espécie é esta?”. Como se fosse uma tarefa trivial e inerente a qualquer pessoa que se propôs a estudar Ciências Biológicas.

A descrição de uma espécie nova remete a chamada taxonomia alfa, o processo de descrições das entidades biológicas e sua adequação às categorias biológicas (o processo de classificação). É a etapa primordial de qualquer estudo que vise conhecer a diversidade que nos cerca, e vem sendo realizado há centenas de anos, a partir do momento em que o homem refletiu o mínimo que fosse sobre o ambiente que o cerca. Não estamos sozinhos e o que nos cerca deve, de alguma forma, ser reconhecido e diferenciado a título de comunicação.

A taxonomia inicia-se com coletas e posterior reconhecimento do material coletado. Passada essa etapa, comparações com material depositado em coleções de museus são inevitáveis a fim de reconhecimento de determinado espécime como novo ou não. Se não, há apenas o reconhecimento de mais um ponto de distribuição para uma espécie já conhecida. Se sim, iniciam-se os procedimentos de descrição, montagem e preparação do material, ilustrações e fotografias, preparação e submissão do manuscrito, e a fixação final de um nome a um espécime depositado em alguma instituição científica por meio da publicação de um artigo científico. Só a partir desse momento temos uma nova espécie.

Mas o que representa isso? Um trabalho de taxonomia criterioso e bem feito, que demora em média e de forma otimista um ano para ser publicado, sem expectativas de reconhecimento por parte da sociedade e muito menos das instituições de fomento é o suficiente para responder a pergunta?

Infelizmente, o estado da arte da taxonomia hoje não é dos mais promissores. A velocidade com que as espécies vêem sendo descritas e classificadas é muito menor que a velocidade do processo de extinção, seja por causas naturais ou não. Vivemos um momento em que há um declínio de pessoas interessadas em fazer taxonomia (ciência básica) e um desinteresse geral da população em conhecer e divulgar resultados que não sejam aqueles das pesquisas aplicadas, ou seja, úteis aos seres humanos. Sem contar as restrições a coletas e empréstimo de material biológico.

Eu não acho que esta seja uma tarefa restrita a jornalistas e editores de revistas. Acredito que os cientistas são responsáveis por divulgar seus resultados em uma linguagem acessível à população em geral. Esse é um dos motivos pelo qual eu criei este blog.

Mas a resposta a pergunta que sempre nos deparamos não é simplesmente o nome. Os nomes pertencem a entidades que se relacionam ao longo do tempo e no espaço, que vêem se modificando ao longo de milhares de anos. Como estabelecido por Croizat (1894-1982), vida (forma) e Terra (espaço) evoluem juntos ao longo do tempo. Reconhecer essas relações evolutivas é uma parte importantíssima do processo e a que permite que essas espécies sejam estudadas em etapas posteriores, como modelos em estudos de ecologia, biogeografia, fisiologia, genética, biologia molecular, embriologia, entre outras.

De que adianta um estudo realizado com modelos biológicos dos quais não se sabe nem mesmo o nome, a que grupo pertence, a quais espécies este meu modelo relaciona-se e para quais grupos meus resultados podem ser extrapolados e para quais não?

Só a Sistemática pode abarcar todas essas questões. A Sistemática é a unidade unificadora de toda a Biologia, o pilar da Biologia Comparada, e é sustentada por três tripés: taxonomia alfa, estudo das relações evolutivas e aplicação desses dados em áreas específicas da Biologia.

A Biologia é uma ciência ainda em construção, mas ao menos desde Aristóteles (384-322 a.C.) pode-se dizer haver uma ciência da Biologia. Atualmente, a Biologia Comparada é uma mistura de paradigmas acumulados ao longo de séculos e corresponde a uma integração de diferentes áreas como a sistemática, a biogeografia e a embriologia. A compreensão da diversidade biológica, da origem do padrão de semelhanças e diferenças é o problema da Biologia Comparada, de modo geral, e da Sistemática, em particular.

O pensamento biológico desenvolveu-se em torno de especialidades, passando de uma visão idealista do homem sobre sua posição dentro da diversidade biológica para uma compreensão das características humanas dentro de um enfoque histórico e temporal. A discussão sobre a gênese da diversidade tem raízes antigas, mas mesmo dentro de um contexto criacionista houve discussões sobre aspectos particulares do processo de criação, em alguns casos questionando pressupostos platônicos e aristotélicos quanto à ontologia das espécies. O advento da teoria da evolução permitiu uma compreensão mais clara da origem da diversidade e da ordem subjacente a ela, mas foi o desenvolvimento de um método de reconstrução da história evolutiva dos grupos, a Sistemática Filogenética ou Cladística, fundamentada pelo entomólogo alemão Willi Hennig (1885-1965), que permitiu a unificação das diferentes áreas da biologia no escopo da Biologia Comparada.

A meu ver, com exceção de algumas espécies presentes no cotidiano de cada biólogo, dificilmente consigamos responder essa pergunta que nos persegue desde o momento em que prestamos vestibular. Não só porque a diversidade que nos cerca é pouquíssimo conhecida ou porque o processo de reconhecimento de espécies envolva a utilização de recursos disponíveis apenas em instituições de pesquisa, mas simplesmente porque um nome sozinho nada representa além de mais um em um somatório de milhões ou bilhões.

A pergunta correta, e essa sim os biólogos têm condição de responder de prontidão, é: com quais espécies esta se relaciona no tempo e no espaço?

Créditos
As imagens são de Chico Felipe (INPA)