quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Os museus e as coleções didáticas!

Ainda que os métodos de coletas sejam relativamente simples – essa é uma questão a ser abordada em uma próxima postagem – e boa parte do material necessário possa ser produzido manualmente com material de fácil aquisição, as coleções didáticas são negligenciadas e deixam de ser preparadas e utilizadas em sala de aulas de escolas e universidades, muitas vezes por falta de informação técnica, de práticas de curadoria e de alguns cuidados básicos.

Os procedimentos de coleta de material biológico e sua posterior conservação, embora passem despercebidos por grande parte da prática científica atual, são de suma importância não apenas em trabalhos de cunho taxonômico e sistemático, mas também em Ecologia, Etologia, Fisiologia e como ferramenta indispensável ao ensino de Ciências.

A diferença principal entre coleções didáticas e científicas é o público-alvo. Coleções didáticas são produzidas com o intuito de mostrar aos alunos parte da diversidade conhecida e geralmente envolve espécimes grandes, vistosos, coloridos, de várias ordens e famílias. De modo geral, não é dada muita atenção à etiquetagem e procedência do material e o acondicionamento se dá mais como uma disposição adequada ao espaço disponível (p.ex. uma gaveta ou caixa) que de acordo com uma organização sistemática, ou seja, grupos evolutivamente relacionados posicionados próximos em um mesmo local. Mas quando essas coleções são elaboradas seguindo-se técnicas de coleta, montagem e preservação, podem sim ser utilizadas para fins científicos, como fonte importante de informação.

O uso de coleções didáticas deveria ser uma prática disseminada nas escolas, uma vez que permite, além de uma aproximação com o mundo natural, observar, registrar, interpretar a natureza e contribuir para preservá-la. Além disso, a noção de evolução das formas vivas, de que as espécies mudam com o tempo tal modo que seus descendentes se tornam novas espécies é facilmente compreendida quando se tem em mente a infinidade de formas e as características compartilhadas por cada uma delas. E não há nada como uma boa coleção – didática ou científica – para instigar nos alunos reflexões a respeito de modificações (morfológicas nesse caso) ao longo do tempo.

Ao se utilizar coleções na prática didática é possível também discutir com os alunos questões referentes à filosofia e história das Ciências, que também vêem sendo abandonadas nas salas de aula, uma vez que renomados cientistas (que os alunos “conhecem” devido a suas teorias) foram grandes naturalistas e colecionadores, como Lineu (1707-1778), Buffon (1707-1788), Lamarck (1744-1829), Cuvier (1769-1832), Darwin (1809-1882), Fritz Müller (1821-1897), Wallace (1823-1913), entre outros. Ao relatar aos alunos um pouco de história e da maneira como as teorias foram sendo desenvolvidas, os professores podem mostrar como a Ciência é dinâmica, como teorias derivam de observações e do entendimento da natureza, e como os resultados de trabalho de um pesquisador são a base e o ponto de partida para outros, mostrando que nenhuma teoria é desenvolvida de forma repentina e solitária, que a ciência é uma atividade de colaboração.

Já as coleções científicas são organizadas de forma Sistemática. Em alguns casos os detalhes não são visualizados a olho nu e nem sempre os espécimes são vistosos e coloridos. Espécimes de alguns grupos são bem pequenos e necessitam de recursos adicionais para serem montados e acondicionados. Uma diferença importante é que este tipo de coleção sempre porta informações de procedência do material, localidade, data, coletor, determinador, métodos de coleta e coordenadas geográficas, visando sempre a repetibilidade da experimentação.

Museus são os depositários de uma rica fonte de informações sobre os mais diversos grupos, e os trabalhos em Taxonomia e Sistemática encontram um terreno fértil de produção científica nessas instituições, onde se tem à mão uma variedade biológica que serve de suporte aos mais variados estudos, desde a taxonomia ao nível alfa (descrição de espécies) até o levantamento de hipóteses de relacionamento entre os táxons e discussões sobre a evolução dos grupos. Afora isso, para qualquer trabalho que utilize espécies como modelos biológicos, é recomendável que se depositem exemplares usados nos seus experimentos em museus, a fim de que outros pesquisadores, interessados em repetir as experimentações, possam confirmar se os modelos em questão são de fato aqueles referidos inicialmente.

Os museus, na qualidade de instituição mantenedora da representação da diversidade biológica, colocam-se na linha de frente na questão da comunicação científica entre pesquisadores (principalmente em relação ao empréstimo de material entre instituições) e na questão da divulgação dos resultados para a sociedade, cabendo a essas instituições, por meio de exposições, fornecer a todos os segmentos da sociedade informação de qualidade, expondo os resultados científicos de forma clara e atraente. E cabe aos professores, até mesmo das escolas que têm coleções, acompanhar os alunos em visitas a essas exposições. Assim, o papel dos museus como instituições depositárias de espécimes, os trabalhos de curadoria ali desenvolvidos, e a utilização de coleções didáticas em sala de aula, mostram-se de fundamental importância como fonte depositária e provedora de informação biológica e histórica.


Sugestões de leitura:

Durrell, G. & Durrell, L. 1996. O Naturalista Amador. Um guia prático ao mundo da natureza. Editora Martins Fontes. 314pp.

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